Meu Diário de Sonhos: o casamento da minha filha e a costura da Alma.

Um sonho sobre amadurecimento, aceitação e os pequenos reparos que antecedem grandes passagens

Este post é sobre um sonho que tive. Sempre dou um título aos meus sonhos, às vezes até um subtítulo. Fica mais fácil localizar o sonho no meu diário quando quero estudá-lo ou tentar compreende-lo melhor.

Alguns sonhos chegam até nós com uma delicadeza surpreendente. Não vêm com símbolos grandiosos ou cenas dramáticas, mas com detalhes sutis que, ao serem olhados com atenção, revelam significados profundos. Recentemente, tive um desses sonhos.

Sonhei com o casamento da minha filha. Isto é algo que não está nos planos dela neste momento (ela ainda é adolescente), mas que, no plano simbólico, pareceu carregar mensagens importantes sobre amadurecimento, tempo interno, aceitação e preparação. E como quase sempre o sonho fala do sonhador, este sonho é para mim.

Como psicóloga junguiana, costumo ouvir sonhos com respeito e responsabilidade, reconhecendo neles um diálogo vivo entre a consciência e o inconsciente. Neste caso, ao refletir sobre as imagens que surgiram, senti que o sonho me falava de algo maior, algo arquetípico. Ele tocava em temas universais: o crescimento dos filhos, o papel da mãe, o medo de não estar “à altura” das exigências da vida, e a sabedoria contida nos pequenos gestos.

Resolvi escrever esse texto como uma forma de honrar o conteúdo simbólico do sonho e, quem sabe, permitir que outras pessoas também se reconheçam em suas imagens.
A seguir, compartilho o relato, entrelaçado com reflexões inspiradas na psicologia simbólica, na escuta dos sonhos e na vida que pulsa por trás deles.

Este foi o sonho:

Sonhei com o casamento da minha filha. Ela estava em outro cômodo, se arrumando. Eu esperava. Fiquei em dúvida se deveria começar a me vestir também. Alguém disse que ainda não era hora, se eu me adiantasse, sentiria frio.
Enquanto eu aguardava a hora de me vestir, questionei a minha escolha de roupa: uma calça e uma camisa, ambas pretas. Será que não estaria muito simples?
E então vi minha filha, ela estava pronta. Vestia um vestido branco, muito belo, mas não convencional. Estava lindíssima.
E então percebi que minha roupa combinava perfeitamente para a cerimônia.
Foi então que lembrei: a calça estava com a costura aberta, bem perto do zíper. Eu precisava costurá-la antes de vestir. Fui até minha mãe e pedi linha e agulha. Ela tinha.
Segui rapidamente para costurar a calça. Já era hora de me vestir.

O sonho e seus significados

Sonhei com o casamento da minha filha. Ela estava em outro cômodo, se arrumando. Eu esperava. Fiquei em dúvida se deveria começar a me vestir também. Alguém disse que ainda não era hora, se eu me adiantasse, sentiria frio.

O que isso pode simbolizar?

Na linguagem simbólica dos sonhos, o casamento costuma representar passagens importantes da vida. Ele fala de amadurecimento, de encontros entre opostos, de novos ciclos que se iniciam. Quando o casamento é de alguém próximo — como uma filha —, o sonho pode estar falando tanto dela quanto de quem sonha.

Nesse caso, a imagem de minha filha, no sonho, representa não apenas a menina real, mas também um aspecto interno que está amadurecendo dentro de mim: algo delicado, feminino, que se prepara para florescer. (Essa ideia também pode ser reportada para minha filha, mas aqui vou fazer a análise subjetiva do sonho, ou seja, o sonho está falando de mim e as imagens que aparecem no sonho são representantes de aspectos da minha personalidade).

O fato de estar em outro cômodo sugere que esse processo acontece em um lugar interno ainda inacessível, reservado, íntimo.

A voz que avisa que ainda é cedo e que, se eu me arrumar, sentirei frio, parece uma mensagem do inconsciente pedindo paciência, dizendo: “ainda não é hora de agir, apressar-se trará desconforto”. O frio, aqui, pode ser o desconforto emocional de se expor antes do tempo, de não estar verdadeiramente pronta.

A roupa como símbolo da Persona

Enquanto eu aguardava a hora de me vestir, questionei a minha escolha de roupa: uma calça e uma camisa, ambas pretas. Será que não estaria muito simples?

No sonho, a roupa representa a forma como nos apresentamos ao mundo — nossos papéis, atitudes, escolhas, nossa Persona. A calça preta existe na vida real. Eu a tenho e ela precisa mesmo da costura, está rasgada na altura no zíper. A camisa preta eu não tenho. Há aí uma mistura entre o conhecido e o novo. Aspectos da Persona permanecem e novos são incorporados.

Ambas as peças são pretas, o que pode sugerir sobriedade, mas também introspecção, contenção, proteção. Além de uma sugestão de que esse processo pode estar gerando luto.
A dúvida sobre a adequação da roupa pode refletir um dilema interno: “sou suficiente da forma como sou?”

Quantas vezes nos sentimos “simples demais”, “discretos demais”, “fora do padrão”?
Esse trecho do sonho parece revelar esse tipo de conflito: o medo de que meu jeito simples não esteja à altura das expectativas externas ou internas, bem como das demandas que a vida apresenta.

A confirmação de que o essencial basta

E então vi minha filha, ela estava pronta. Vestia um vestido branco, muito belo, mas não convencional. Estava lindíssima.
E então percebi que minha roupa combinava perfeitamente para a cerimônia.

Essa parte do sonho traz um ponto de virada.
Minha filha — esse aspecto que está florescendo — não segue padrões rígidos. Ela está bonita, mas à sua maneira. E isso permite que eu me reconheça como também adequada, legítima, suficiente.

É uma mensagem que estimula a aceitação: aquilo que parecia simples era, na verdade, estava de acordo com o momento. É como se o inconsciente dissesse: não é necessário se vestir de outra pessoa para estar pronta para o novo ciclo. Você, do seu jeito, já está em sintonia com o que está por vir.

A costura como símbolo de reintegração e cura

Foi então que lembrei: a calça estava com a costura aberta, bem perto do zíper. Eu precisava costurá-la antes de vestir. Fui até minha mãe e pedi linha e agulha. Ela tinha.
Segui rapidamente para costurar a calça. Já era hora de me vestir.

Eu achei essa imagem muito significativa. A calça, é símbolo de algo que eu já uso, do que é real e cotidiano. Ela tem um pequeno defeito, que fica próximo a região íntima, sugerindo algo delicado que precisa de atenção antes que se exponha ao mundo.

Costurar, simbolicamente, é reunir o que foi separado, é curar, restaurar, preparar.
E pedir linha e agulha à minha mãe indica um retorno à origem — ao cuidado, ao feminino ancestral que sustenta, orienta, provê.

Esse trecho convida a humildade e orienta com sabedoria: antes de se lançar ao novo, é preciso cuidar do que está por “dentro”. E às vezes, é na costura silenciosa, quase invisível, que nossa alma se prepara para atravessar os portais da vida.

Um sonho como este não fala apenas de um casamento, mas de um momento em que algo dentro de nós se prepara para atravessar uma nova fase. E para isso, tudo o que precisamos é respeito pelo tempo, confiança na própria essência e a coragem de costurar, com ternura, aquilo que ainda pede reparo.

A interpretação do sonho não para por aí. Quando o sonhador está em um processo terapêutico, os temas que o sonho desperta são abordados na terapia. No meu caso, por exemplo, seria interessante aprofundar sobre temas como: a adolescência da minha filha (quase o fim da adolescência dela, o que gera um novo ciclo tanto para ela, quanto para mim); minha menopausa; os projetos que estou desenvolvendo e que estão me lançando em uma novas jornadas, e talvez outras questões que podem ainda ser um ponto cego para mim, mas que meu analista certamente está atento.

Os sonhos são um recurso incrível para o autoaperfeiçoamento.

Que possamos reconhecer nossos próprios ritos de passagem, mesmo nos pequenos gestos do cotidiano. E que, quando necessário, saibamos buscar a linha e a agulha que nos reconectam com o que importa.

Bons sonhos para você!

Sobre a autora

Giane é psicóloga junguiana com mais de 20 anos de experiência em interpretação dos sonhos. Apaixonada por simbolismo e autoconhecimento.

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